terça-feira, 11 de setembro de 2012

Em meio a crise internacional, Fedex, UPS e DHL se armam para brigar pelo Brasil


Fedex e UPS compraram neste ano operações importantes com tradição no transporte rodoviário no país e encostam nas maiores do ranking. DHL não descarta ir as compras

Dubes Sônego | 06/08/2012 05:00:00

Com a aquisição da Rapidão cometa, a Fedex tornou-se da noite para o dia uma das cinco maiores companhias de transporte rodoviário do país.

O transporte rodoviário de cargas no Brasil vive um rearranjo de forças que está transformando de maneira profunda a forma como as grandes companhias internacionais de logística operam no país. Em meio às tentativas do governo de regulamentar a jornada de trabalho dos motoristas, gigantes como UPS e Fedex avançam com aquisições que colocarão sob sua tutela operações montadas por nomes tradicionais do mercado local, como Rapidão Cometa, Mercúrio e Expresso Araçatuba. A alemã DHL, por ora, mantém o discurso do crescimento paulatino com investimentos próprios para ganhar espaço neste mercado bilionário. Mas não descarta ir às compras para avançar mais rápido.

O ramo de transporte rodoviário de cargas brasileiro sempre teve como característica a baixa participação de empresas estrangeiras. Na lista das dez maiores do país, por exemplo, contam-se unicamente empresas nacionais e de controle familiar. De modo geral, são empresas com décadas de operação e atuação diversificada. Algumas fazem desde a distribuição de automóveis, das fábricas às concessionárias, até o transporte expresso de cargas. Outras se dedicam à movimentação de produtos e insumos dentro das fábricas dos clientes, ou se especializaram no gerenciamento de suas frotas.

A holandesa TNT, até agora, era única exceção de relevo nesse cenário marcado por empresas nacionais. Mas teve uma trajetória conturbada nos últimos anos. Começou no país em 1982 e deus seu grande salto na segunda metade da década passada, com a comprou de duas grandes empresas de cargas rodoviárias, a Mercúrio e a Expresso Araçatuba, em 2007 e 2009. O tiro, porém, saiu pela culatra e já em 2010 a empresa se viu constrangida por prejuízos de mais de 200 milhões de euros, resultado da perda de grandes clientes em processo de integração que virou referência do que não se fazer.

Nova onda

A investida de agora é mais ampla. A primeira movimentação foi feita pela UPS, que comprou internacionalmente a TNT em março, por 5,16 bilhões de euros – 9,5 euros por ação. Em seguida, em maio, foi a vez da Fedex anunciar a aquisição no Brasil da pernambucana Rapidão Cometa, uma das cinco maiores empresas do país em seu ramo de atuação, com receita estimada em cerca de R$ 1 bilhão em 2011.

Concretizada em julho, a compra da Cometa foi um passo imenso para a Fedex. Até o ano passado, assim como suas rivais UPS e DHL, tinha estrutura e operações bem mais enxuta e foco principalmente na importação e exportação de cargas expressas. De uma vez, a companhia americana agregou operações rodoviárias com 45 filiais, 145 pontos de distribuição e 770 veículos e um terminal alfandegado no porto de Suape. O número de cidades atendidas passará de 2 mil cidades para cerca de 5,3 mil. “Imagine selecionar todo mundo e começar do zero”, diz o presidente de uma das dez maiores companhias de logísticas do país. “Não é um negócio como a indústria, que depende somente de recursos para construir e produzir. É preciso tempo para se desenvolver uma rede ampla de contatos e relacionamentos”, afirma o empresário.

O caso da UPS é um pouco diferente do da Fedex. A compra da TNT lá fora ainda depende da aprovação do órgão de defesa da concorrência da União Europeia. Por temor de concentração de mercado, foi aberta uma investigação sobre os potenciais impactos econômicos do negócio, que deverá ter um desfecho até o final do ano.

Ainda assim, poucos no mercado acreditam que, mesmo que seja impedida de adquirir a rival holandesa, a companhia americana deixará um território emergente e promissor como o brasileiro desguarnecido e entregue à principal rival. Principalmente em um momento em que a Europa está em crise, a economia americana patina e os Correios, estatal brasileira do setor, assiste a retomada da contestação de seu monopólio na entrega de cartas. “A aquisição feita pela Fedex com certeza vai gerar reação”, diz José Eduardo Amato Balain, professor do curso de administração da Escola Superior de Propaganda e Marketing. Trata-se da disputa por um mercado que movimentam bilhões e que rendeu somente às dez maiores empresas do transporte rodoviário de cargas no país mais de R$ 6,5 bilhões, em 2010. O ranking mais recente da revista especializada Transporte Moderno é liderado pela JSL, um dos raros casos de capital aberto do setor. Com R$ 1,6 bilhão de receita operacional líquida em 2010, a companhia é seguida por Tegma e da Sada, com resultados de R$ 921 milhões e R$ 771 milhões, respectivamente.

Mercado peculiar

Uma das grandes questões, caso isso aconteça, será encontrar boas opções à venda no mercado. Na avaliação de executivos e especialistas, o fato de o setor ainda ser muito jovem e pouco profissionalizado no Brasil limita o número de empresas que combinem porte e governança. Durante décadas, as dimensões continentais do país, as peculiaridades de sua infraestrutura e de sua legislação levaram grandes companhias de setores com bebidas, alimentos e varejo, a montarem estruturas próprias de entrega capazes de cobrir o país inteiro, em até um dia e meio. O que limitou o número de clientes disponíveis para que o mercado se desenvolvesse.

A situação começou a mudar com a estabilização da moeda e a forte expansão econômica da última década. Mas o mercado ainda é muito complexo e pulverizado. É em parte por isso, afirma Juliana Vasconcelos, diretora de vendas da DHL Express no Brasil, que a companhia alemã vem optando por crescer montando sua própria estrutura a partir do zero. Os investimentos mais recentes foram na construção de centros de distribuição na Bahia e em Recife. Estão planejados investimentos em expansão da frota e em um centro de distribuição no interior de São Paulo. Mas a companhia, que atende cerca de 1,5 mil cidades brasileiras, não abre valores.

Segundo ela, a companhia está sempre avaliando aquisições que possam atender às suas necessidades de expansão. No cenário de hoje, porém, a DHL não vê essa necessidade, afirma, justamente porque está fazendo isso organicamente. “A gente sabe que a realidade do mercado brasileiro em logística é muito complexa. Houve experiências passadas de aplicação de modelos internacionais que não funcionaram aqui. Custo do transporte é alto, malha rodoviária não é boa, a segurança é custosa. Isso demanda das empresas internacionais uma adequação à essa realidade”, diz. É um discurso afinado com o de Frank Appel, presidente mundial da companhia, que disse ao Financial Times, em maio, que há expectativa de que a UPS perca parte do foco durante complexo o processo de integração da TNT Express no mundo, o que deixaria a rival mais vulnerável a investida de concorrentes sobre seus clientes.

Barreiras

Cientes das barreiras impostas pelo custo Brasil e às dimensões territoriais brasileiras, empresários do setor se mantem céticos em relação à investida estrangeira. Para alguns, como Urubatan Helou, diretor presidente da Braspress, especializada em cargas expressas e quinta do ranking brasileiro, a UPS vai assumir um “esqueleto” e a Fedex ainda terá que passar pela prova da integração que abalou a TNT. “Assumiram duas grandes empresas e estão tentando gerir o que sobrou delas”, diz o empresário. Helou faz parte de um grupo que acredita mais na possibilidade de que aconteça o contrário, a internacionalização de empresas brasileiras do ramo. Ao menos nos planos da Braspress, a possibilidade aparece, ainda que, por ora, de forma etérea. “Estamos trabalhando no aperfeiçoamento de alguns de nossos processos”, afirma.

Independente do sucesso de uma eventual internacionalização de transportadoras brasileiras, resta saber se a investida de agora das gigantes estrangeiras terá mais consistência que a do passado. O mercado não deve demorar a descobrir.

* Procurados, os Correrios disseram que não se manifestariam a respito da investida estrangeira no país. A Fedex informou que não teria porta-voz disponível e a UPS não está falando sobre o assunto no Brasil no momento.

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